OMELETE COMPARTILHA RESENHA DE “SOMETHING BEAUTIFUL”, O ACLAMANDO O MELHOR ÁLBUM DE MILEY E DE 2025
- admin
- há 2 dias
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Obviamente, esta resenha do site brasileiro Omelete não contou para o Metacritic. Mas ela ficou TÃO boa que precisávamos compartilhar! Leia na íntegra:

Referencial, Something Beautiful é o melhor de Miley Cyrus - e de 2025
Intransigente, popstar faz Álbum com “A” maiúsculo quando isso parece fora de moda
Parece que foi de propósito. Exatamente no momento em que “End of the World”, a terceira faixa do Something Beautiful, vai alcançando a marca de três minutos de duração, os corais repetitivos do pós-refrão da balada apocalíptica ensolarada coescrita e coproduzida por Miley Cyrus com os membros da banda indie pop Alvvays vão desaparecendo por trás dos violões acústicos que definem sua aproximação da surf music e do pop rock radiofônico dos anos 1970, sinalizando (o ouvinte presume) o final da canção. Mas não é o caso. “End of the World” tem mais 1:31 de duração, e o respiro dos corais é só a calmaria antes da tempestade, conforme Cyrus e cia. nos jogam em uma última repetição do refrão que representa a apoteose das elaborações instrumentais que o precederam. Um orgasmo pop, mais saboroso porque levamos um tempo para chegar nele.
Houve um tempo, é claro, em que isso era procedimento padrão. Um tempo assassinado pela era do streaming musical, em que compositores, produtores e artistas pop competem para descobrir quem consegue fazer a canção mais grudenta em menos minutos, a fim de incentivar as audições repetidas e inflar os números de reproduções nas plataformas. Quando Cyrus descreveu o Something Beautiful como “uma tentativa de medicar uma cultura que parece meio doente”, todo mundo presumiu que ela estivesse tentando fazer algum tipo de declaração sociopolítica, ou que estivesse perdida nas próprias ilusões de grandeza - mas existe uma chance expressiva de que ela só estivesse falando de fazer um Álbum Pop com ‘A” e “P” maiúsculo, o que parece meio fora de moda ultimamente.
Não é só na duração, inclusive, que o Something Beautiful resgata algo que seus contemporâneos não fazem mais. Há também um amor pela rima sonora, no meio das muitas explorações de gênero que o disco faz, que parece ter se perdido conforme a coesão de um disco pop passou a importar menos diante da capacidade do público de selecionar uma ou duas músicas para ouvir perenemente, em alguma playlist pessoal, fora do contexto original. Não que as faixas do Something Beautiful não funcionem por si, mas elas têm tecidos conectivos surpreendentes, que são deliciosos de perceber.
Se a faixa-título “Something Beautiful”, por exemplo, emprega trompetes jazzísticos para apimentar sua proposta inicial simples de bateria-e-baixo, em “More to Lose” esse sopro retorna na forma de um solo de saxofone aveludado que carrega a balada de piano para o seu terceiro ato, e em “Every Girl You’ve Ever Loved” o sax retorna como introdução e pontuação apropriadamente setentistas para um número dançante de ballroom nova-iorquino. Se Brittany Howard (do Alabama Shakes) dá energia para “Easy Lover”, pop propulsivo coassinado por Ryan Tedder, com sua guitarra ardida, ela retorna para cantar e tocar em “Walk of Fame”, um épico lisérgico de 6 minutos sobre amor e vida nos holofotes não faria feio na discografia do Blondie. De personagem de fundo à protagonista, e de volta outra vez.
Eu poderia, na verdade, gastar parágrafos e mais parágrafos desenhando esses paralelos. Ou ainda poderia passar linhas e mais linhas falando de como o Something Beautiful acerta em cheio a progressão, dentro de suas 13 faixas, entre o rock-jazz das primeiras faixas, que reintroduzem Miley como uma cantora-compositora de inspirações clássicas (pense Carole King, Stevie Nicks, Carly Simon), e a eletrônica new wave de sintetizadores e corais cavernosos que domina a segunda metade do disco. “Walk of Fame” é a faixa que faz a transição se tornar definitiva, de fato, mas ela é preparada nos dois interlúdios instrumentais que ocorrem antes no disco, e aprofundada com os ecos de Kate Bush, Madonna e Nina Hagen em canções como “Pretend You’re God” e “Reborn”, nos reintroduzindo à noção de que o pop pode ser - e é! - um desafio de olhar para o passado apontando para o futuro.
Liricamente, enquanto isso, Something Beautiful encontra Cyrus em um espaço tão machucado quanto o disco anterior, Endless Summer Vacation (2023), que escondia algo de ressentido por baixo de sua produção impecavelmente envernizada. Aqui, ela fala de amores condenados e relações tóxicas das quais não consegue se desvencilhar, de adorar um rapaz que “parece um astro de cinema com seu casaco surrado”, mas se decepcionar quando o amor acaba e ela percebe que os dois “tinham pouco a perder”. Mas ela ainda está tentando capturar o tal “algo bonito” que batiza o álbum em meio a toda essa mágoa, tentando se convencer do valor das lições que aprendeu e da independência que ganhou. Nem sempre é fácil, mas ela tenta.
Da minha parte, honestamente? Enquanto Miley estiver fazendo música pop tão intransigente, deliberadamente contrária à maré, e cheia de prazeres que há muito se desmancharam no éter da evolução tecnológica da música contemporânea… ela pode, e deve, continuar tentando.
Via: Omelete.com.br
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